sábado, 23 de novembro de 2013

DIREITO CIVIL I - NEGÓCIO JURÍDICO - Invalidade do Negócio


Este trabalho é um resumo do
Cap XIV do Livro Novo Curso de Direito Civil 1 (parte geral) do renomado Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, 15ª Ed. Ano:2013.
Qualquer erro, por favor, me reportem.


8 - INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO: Anteriormente estudamos os defeitos dos negócios jurídicos e suas conseqüências, neste tópico abordaremos sobre essas conseqüências no plano das validades, uma vez que o código civil resguardou em artigo próprio a matéria em questão, visto como de grande importância.

            A nulidade de um ato jurídico pode ser absoluta (ato nulo) ou relativa (ato anulável), os atos nulos são aqueles relacionados com a natureza pública do negócio, já os relativos são de natureza particular.

            É importante ressaltar que a nulidade de um ato jurídico não implica na nulidade do negócio como um todo, uma vez que descartado o ato invalido pode ser aproveitado alguma coisa do negócio e o mesmo pode ser provado de outra forma que existe (Art. 183, CC/02), além disso de acordo com o princípio da conservação uma obrigação secundária anulada não interferiria na obrigação principal.

9 - NULIDADE ABSOLUTA: Abaixo será listada as causas de nulidade absoluta dos negócios jurídicos (Art. 166 e 167, CC/02).

   a)    Celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
   b)    For ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
   c)    O motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
   d)    Não revestir a forma prescrita em lei;
   e)    Preterir alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
    f)     Tiver por objeto fraudar a lei imperativa;
   g)    A lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção;
   h)   Tiver havido simulação.

            É importante ressaltar o item que cita a fraude como um motivo de nulidade absoluta, já foi visto que a fraude contra credores é uma das causas de vício do negócio jurídico, porém não é este o motivo pretendido pelo legislador no (Art. 166, Inc. VI, CC/02), a fraude citada no referido artigo diz respeito a in fraudem legis, que seria a fraude contra a lei.

            Os casos supracitados de nulidade, podem ser requeridos por qualquer pessoa a quem interessar ou o ministério público quando lhe couber, devendo o juiz declarar de ofício, devendo ainda o juiz declará-la sempre que encontrar alguma causa de nulidade, não podendo o mesmo supri-las, mesmo que a requerimento dos interessados (Art. 168, CC/02).

            Sobre a prescritibilidade de um negócio jurídico nulo, o ordenamento afirma ser imprescritível (Art. 169, CC/02), ainda é importante salientar que a nulidade deve ser declarada, caso não seja, o negócio permanecerá ativo até que o juiz o faça.

            Ainda sobre a imprescritibilidade temos que ela só ocorre quando a intenção da petição for exclusivamente declaratória de nulidade, caso seja requisitado ressarcimento ou mesmo condenação penal, neste caso o negócio passa a ser prescritível nos termos da lei.

            Já vimos que ao solicitar que o ato seja declarado com nulo, devemos nos ater as conseqüências dessa declaração, quando for simplesmente declaratória a mesma é imprescritível, já aqueles que visam de alguma forma ressarcimento oneroso passa a ser prescritível, é importante ressaltar também sobre os efeitos da nulidade, o ato nulo possui efeito ex tunc, ou seja, retroage até o momento inicial do negócio. Para compreender melhor imagine uma contratação de um trabalhador por um menor de idade, neste caso é um motivo de nulidade absoluta, uma vez que o menor não tem capacidade para efetuar tal contratação, passado um tempo o contratado resolve solicitar a declaração de nulidade daquele contrato e o ressarcimento do mesmo, neste caso será permitido o ressarcimento e o negócio ainda continua tendo sua pretensão imprescritível, uma vez que anulado tal negócio é preciso que o mesmo volte a condição que se encontrava anteriormente, não sendo possível por motivos óbvios, só resta ao juiz declarar a nulidade e indenizar o contratado por sua mão de obra utilizada, retornando ao status quo ante.

10 - NULIDADE RELATIVA: A nulidade relativa como já foi citada, é aquela em que o bem jurídico atacado é geralmente particular, ou seja, ele não interessa tanto quanto o bem público para o direito, por isso ele detém o status de anulabilidade.

            Nesse sentido cuida o ordenamento jurídico em seu (Art. 171, CC/02) de elencar os casos de nulidade relativa, além dos casos previstos em lei, sendo eles: por incapacidade relativa do agente e por vício resultante de erro, dolo, estado de perigo, coação, lesão ou fraude contra credores.

            Neste caso não pode o juiz reconhecer de ofício, cabendo a parte lesada procurar seus interesses, devendo entrar com a chamada ação anulatória de negócio jurídico em um prazo máximo de 4 (quatro) anos (Art. 178, CC/02) ou 2 (dois) anos em caso de que a lei dispuser como fator de anulação e não citar prazo (Art. 179, CC/02).
            No que tange a questão da anulação de um negócio jurídico em se tratando de princípios, temos o chamado princípio da conservação que visa manter o negócio jurídico viciado, porém livre do vício que o tornava anulável. Este princípio pode ser acessado desde que ambas as partes declarem interesse (medidas voluntárias), ou em casos que a própria lei o diga (medidas involuntárias) como a pretensão de prescrição, por exemplo, (Art. 172, CC/02).
            A confirmação de manutenção do negócio jurídico acima citado (viciado) poderá ser de forma expressa, neste caso as partes expressam claramente e objetivamente seu desejo de reafirmarem todos os termos do negócio jurídico, essa declaração deverá constar ainda a substância e a vontade expressa de manter o negócio (Art. 173, CC/02), ainda temos a declaração de forma tácita, neste caso não é declarada de forma clara que existe intenção de manter o negócio, porém os atos das partes, cientes de que o negócio é viciado, demonstram que elas têm interesse em manter ativo tal negócio, uma vez que uma ou ambas as partes cumprem com suas obrigações (Art. 174, CC/02).
            Uma vez confirmado o negócio por via expressa ou tácita, extingue-se todas as ações ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor (Art. 175, CC/02), ainda temos que sendo a falta de autorização de um terceiro o motivo de anulabilidade de um negócio, este será confirmado se o terceiro a der posteriormente (Art. 176, CC/02).
            Em síntese a anulabilidade não tem nenhum efeito antes de ser julgada por sentença e não pode o juiz se pronunciar de ofício (Art. 177, CC/02), além disso temos os casos em que o ordenamento trata do menor, sendo declarado que o menor não pode se eximir de uma obrigação, invocando sua idade, se dolosamente a ocultou quando inquerido pela outra parte ou no ato de obrigar-se declarou-se maior (Art. 180, CC/02), ainda não pode ninguém reclamar de ter pago a um menor, por uma ação anulada, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga (Art. 181, CC/02).
            Finalmente falaremos dos efeitos de uma ação anulatória de um negócio anulável, em caso de concebida a devida ação, ela será considerada desconstitutiva ou constitutiva negativa, isso quer dizer que, a luz do que prega o código de processo civil, os efeitos anteriores seriam mantidos e os efeitos anulatórios contariam a partir daquele momento (ex nunc), porém para o professor PABLO STOLZE, isso é uma inverdade, uma vez que imagine o exemplo de um negócio feito sobre o vício da lesão em que você se vê obrigado a pagar um sinal (arras) de 15.000 (quinze mil reais), uma vez anulado futuramente o negócio é de se esperar que seus efeitos sejam anulados desde o início do negócio e seu arras seja restituído, ou seja, efeitos (ex tunc) (Art. 182, CC/02), nessa linha de pensamento cumpre citar o Prof. HUMBERTO THEODO JÚNIOR que defende:
            “São casos especiais de sentença constitutiva: a) sentença que anula o ato jurídico por incapacidade relativa do agente, ou vício de erro, dolo, coação, simulação ou fraude, porque sua eficácia é ex tunc em decorrência do art. 158 do Código Civil, que manda, in casu, sejam as partes restituídas ao estado em que se achavam antes do ato anulado”.
Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, 18. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. I, p. 519.
            Terminando tal resumo e para melhor fixar o que aqui foi dito, abaixo segue uma tabela extraída deste livro:
NULIDADE ABSOLUTA
NULIDADE RELATIVA
O ato nulo atinge interesse público superior.
O ato anulável atinge interesses particulares, legalmente tutelados.
Opera-se de pleno direito.
Não se opera de pleno direito.
Não admite confirmação.
Admite confirmação expressa ou tácita.
Pode ser arguida pelas partes, por terceiro interessado, pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir, ou, até mesmo, pronunciada de ofício pelo juiz.
Somente pode ser arguida pelos legítimos interessados.
A ação declaratória de nulidade é decidida por sentença de natureza declaratória de efeitos ex tunc.
A ação anulatória é decidida por sentença de natureza desconstitutiva de efeitos ex tunc.
Pode ser reconhecida, segundo o Novo Código Civil, a qualquer tempo, não se sujeitando a prazo prescricional ou decadencial.
A anulabilidade somente pode ser arguida, pela via judicial, em prazos decadenciais de quatro (regra geral) ou dois (regra supletiva) anos, salvo norma específica em sentido contrário.
11 – CONVERSÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO: A conversão de um negócio jurídico nulo ou anulável é uma medida que visa respeitar o princípio da conservação, em que um negócio mesmo viciado ou nulo de pleno direito, poderia ser convertido em outro observando os preceitos formais e materiais.
            Imagine uma nota promissória nula por inobservância dos requisitos legais, seria aproveitada como compromisso de dívida, por exemplo.

            A conversão ainda exige alguns pressupostos como o material e o imaterial. No primeiro aproveitam-se os elementos fáticos do negócio inválido, enquanto que no segundo aproveita-se a intenção dos declarantes direcionada à obtenção da conversão negocial.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

HERMENÊUTICA - Aspectos introdutórios e métodos de interpretação

1. Aspectos iniciais
A hermenêutica é a ciência que determina os fundamentos, regras e maneiras de interpretação. No seu campo de atuação, trata do princípio da interpretação de símbolos, sinais, leis, normas, etc.

No início do nosso estudo, cumpre salientarmos a colocação de Carlos Maximiliano, que entendia que a Hermenêutica Jurídica tinha por “objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito”[1]. Para Maximiliano, a Hermenêutica qualificava “a teoria científica da arte de interpretar”[2].

Nelson Saldanha[3] coloca que:

“O surgimento de uma teoria da hermenêutica se tornou possível quando se conheceu a história dos diversos modos de interpretar, e quando o próprio interpretar foi entendido como um processo abrangedor de componentes objetivos e subjetivos. Ela surgiu em ligação com a filosofia e a arqueologia, os métodos comparativos e a filosofia sistematizante: surgiu com Schleiemacher, com Böckh, com o próprio Nietzsche e depois com Dilthey”.

Quanto à etimologia, Richard Palmer[4] coloca que o termo hermenêutica lembra o verbo grego hermeneuein (que significa interpretar) e também o substantivo hermeneia (traduzido como interpretação).

Em seu artigo, José Fábio Rodrigues Maciel[5] afirma que:
“Há correntes que apontam a origem do nome ao deus grego Hermes, filho de Zeus com Maia, sendo, nesse caso, associado à função de transmutar aquilo que estivesse além do entendimento humano em uma forma que a inteligência humana pudesse compreender. Hermes traduzia as mensagens do mundo dos deuses para o mundo humano. Sua figura era tão marcante que foi atribuído a ele a descoberta da linguagem e da escrita, e sua função de mensageiro sugere, na origem da palavra hermenêutica, o processo de trazer para a compreensão algo que estivesse incompreensível”.

Por sua vez, Kelsen[6] declara que:
“A interpretação é, portanto, uma operação mental que acompanha o processo da aplicação do Direito no seu progredir de um escalão superior para um escalão inferior. Na hipótese em que geralmente se pensa quando se fala de interpretação, na hipótese da interpretação da lei, deve responder-se à questão de saber qual o conteúdo que se há de dar à norma individual de uma sentença judicial ou de uma resolução administrativa, norma essa a deduzir da norma geral da lei na sua aplicação a um caso concreto”.
A interpretação em si consiste em compreender o que está sendo lido. É a apreensão das informações contidas no texto, seja ele verbal ou não-verbal. O intérprete se comunica com o texto por meio da linguagem. É importante lembrar que não se devem transpor os limites de significação do texto, ou seja, afirmar coisas que não existem na obra do produtor.
2. A aplicação da hermenêutica no direito
É inerente ao trabalho do jurista o ofício da interpretação. A interpretação das leis e dos casos concretos ajuda a dirimir conflitos. “A própria elaboração das regras jurídicas sempre implicou um pensamento que seleciona, articula, distingue, prevê; a imposição das regras, com o julgamento e a sanção, sempre foi um momento interpretativo”[7]. Nesse sentido, é interessante citar o pensamento de Tércio Sampaio[8]:
“A determinação do sentido das normas, o correto entendimento do significado dos seus textos e intenções, tendo em vista a decidibilidade de conflitos constitui a tarefa da dogmática hermenêutica. Trata-se de uma finalidade prática, no que se distingue de objetivos semelhantes das demais ciências humanas. Na verdade, o propósito básico do jurista não é simplesmente compreender um texto, com faz, por exemplo, o historiador ao estabelecer-lhe o sentido e o movimento no seu contexto, mas também determinar-lhe a força e o alcance, pondo o texto normativo em presença dos dados atuais de um problema. Ou seja, a intenção do jurista não é apenas conhecer, mas conhecer tendo em vista as condições de decidibilidade de conflitos com base na norma enquanto diretivo para o comportamento”.
Sob essa ótica, a hermenêutica é peça imprescindível no entendimento dos textos normativos. Através da interpretação podemos diminuir o abismo gnoseológico existente entre significante, significado e fato juridicamente relevante.
“Pode-se explicar o que aqui o que se compreende por abismo gnoseológico mediante três problemas que o compõem e que precisam ser transpostos ou ao menos tratados pela teoria do conhecimento: são as incompatibilidades recíprocas entre: a) evento real; b) ideia (ou “conceito”, “pensamento”); e c) expressão linguística (ou “simbólica”). Estas são as três unidades componentes do conhecimento humano, as quais não podem ser reduzidas uma à outra. Como são todos termos ambiguamente empregados na linguagem filosófica, necessário tentar melhor precisá-los”[9].
Corroborando com essa afirmação, temos o ponto de vista de Noel Struchiner[10], quando ele afirma que “as limitações da linguagem refletem diretamente na possibilidade de concretização dos propósitos do direito”. “Em função da textura aberta da linguagem, a indeterminação linguística é indelével”[11].
É pertinente a colocação de Nelson Saldanha[12]:
“O problema da linguagem corresponde a um processo histórico-cultural fundamental para a questão do compreender, do ‘significado’ e da interpretação. A atribuição de significados, que constitui basicamente o fenômeno hermenêutico, envolve a experiência da linguagem, com o entendimento dos signos e de uma série de contextos. Trata-se de um problema essencial quanto à própria existência da cultura: toda cultura tem seus códigos”.
A hermenêutica jurídica procura delimitar o sentido e o alcance das regras jurídicas analisando todo o espaço amostral em que pode variar o significado do texto, sem esquecer-se da ambiguidade e vagueza presentes nele.
Historicamente, os romanos dividem a lei em três elementos constituintes: o corpus (corpo) significa o texto da lei, o significante da lei, o símbolo que procura representar o que a lei é de fato; a mens pode ser traduzida como o sentido da lei; e a ratio é a finalidade da lei, a que ela se propõe, a que serve: é a teleologia da lei. É nesse último caso que entra o trabalho do hermeneuta, no que concerne à explicitação, construção e aplicação da norma jurídica diante do caso concreto.
Lembrar que, a depender da interpretação, o sentido de uma lei pode ser ampliado para além do que o texto prescreve (praeter legem). Assim, o trabalho do decididor é facilitado, pois ele pode contar com um maior quórum de significações da mesma coisa. E isso é importante porque a realidade e bastante complexa e específica, diferentemente do que a nossa mente nos transmite, uma vez que esta é generalista.
3. A relação entre interpretação, aplicação e integração no Direito
A tarefa de interpretar consiste em procurar o entendimento do texto em análise. Sobre a mesma lei, por exemplo, podemos ter várias interpretações (aqui entram os conceitos de ambiguidade e vagueza; sentido e alcance), porém só uma nos será útil e/ou favorável para a resolução da lide.
Em íntima relação com a interpretação, temos a aplicação, que consiste em aglutinar a interpretação da letra de uma lei com a realidade imposta; juntar norma e caso concreto.
Por seu turno, a integração tem por objetivo procurar preencher as lacunas existentes no ordenamento jurídico. Lacunas são conhecidas, de uma maneira simplificadora, como “regras de menos”. É falta de fontes do direito que versem sobre um ou outro caso específico. É a falta de norma adequada para ser aplicada a um fato, a uma questão.
Para resumir, devemos assinalar o que Miguel Reale[13] ensina:
Interpretação, integração e aplicação são três termos técnicos que correspondem a três conceitos distintos, que às vezes se confundem, em virtude de sua íntima correlação. O Direito [...] é sempre uma prescrição ou imperativo, e não uma simples indicação que possa ou não ser atendida, a critério exclusivo dos interessados. O Direito existe para ser obedecido, ou seja, para ser aplicado. Todos nós, na nossa vida comum, aplicamos o Direito. Não se realiza contrato algum sem que uma forma de juridicidade se aplique nas relações humanas.
O termo "aplicação do direito" reserva-se, entretanto, à forma de aplicação feita por força da competência de que se acha investido um órgão, ou autoridade. O juiz aplica o Direito porquanto age, não como homem comum, mas como membro do Poder Judiciário. O mesmo acontece com o administrador. A aplicação do Direito é a imposição de uma diretriz como decorrência de competência legal.
Mas, para aplicar o Direito, o órgão do Estado precisa, antes, interpretá-lo. A aplicação é um modo de exercício que está condicionado por uma prévia escolha, de natureza axiológica, entre várias interpretações possíveis. Antes da aplicação não pode deixar de haver interpretação, mesmo quando a norma legal é clara, pois a clareza só pode ser reconhecida graças ao ato interpretativo. Ademais, é óbvio que só aplica bem o Direito quem o interpreta bem.
Por outro lado, se reconhecemos que a lei tem lacunas, é necessário preencher tais vazios, a fim de que se possa dar sempre uma resposta jurídica, favorável ou contrária, a quem se encontre ao desamparo da lei expressa. Esse processo de preenchimento das lacunas chama-se integração do direito (...)”.
4. O silogismo jurídico
Como se pode pensar, num primeiro momento, uso de silogismos (algumas vezes, quase que usando uma lógica automática, instantânea) no fazer jurídico não tolhe a capacidade de interpretação nem limita a atuação do jurista no seu trabalho com os textos jurídicos. Ao contrário, a interpretação é algo de uma significação muito grande na prática do direito.
De um modo genérico, podemos caracteriza um silogismo como contendo três partes: premissa maior, premissa menor e conclusão. Trazendo o silogismo para os usos no direito temos que a premissa maior é a lei, aplicada em consonância com o caso concreto, que é a premissa menor. A conclusão é essa aplicação da lei para o caso concreto.
O silogismo jurídico é um tipo de silogismo prático, pois vem revestido da ideia de um dever ser (deontologia). Ele prescreve como devem agir os indivíduos aos quais se aplicam uma norma específica. Esse é diferente do silogismo teórico, que apresenta uma conclusão que afirma algo e não necessariamente regula ou prescreve uma norma de conduta.
5. Os métodos tradicionais de interpretação
“Os chamados métodos de interpretação são, na verdade, regras técnicas que visam à obtenção de um resultado. Com elas procuram-se orientações para os problemas de decidibilidade dos conflitos”[14].
5.1 Método exegético
Pregado pela Escola da Exegese francesa, esse método é levado a cabo pelos apregoadores do juspositivismo legalista. Este defende uma antropologia iluminista, em que a razão sobrepõe a vontade (emoção). Afirma que a lei é sinônimo de norma jurídica, ou seja, a linguagem humana descreve a realidade tal como ela é. Nesse caso temos a univocidade da linguagem. Isto constitui um equívoco: pensar que normas e texto são a mesma coisa[15]. Também temos que o juiz nunca origina a lei, sendo simplesmente um aplicador dela (la bouche de la loi), apenas reconhecendo o direito. Sendo assim, a interpretação é sempre literal: deve-se aplicar exatamente o que está no texto da lei, daí o brocardo in claris non fit interpretatio (na clareza, não cabe interpretação). O justo é aquilo que a lei diz que é justo. Aqui encontramos a tese da única resposta correta, encontrada dedutivamente.
Vale salientar que a autora do texto concorda com Maria Helena Diniz[16] na afirmação de que nenhuma norma é tão clara que não seja passível de interpretação. Baseado nisso, vê-se tacitamente o desprezo dela pelo legalismo.
5.2 Método lógico
Aqui não são mais analisados os termos do texto prescritivo separadamente. Interpretam-se as proposições veiculadas por ele, de uma maneira que se tenha um entendimento global.
As possíveis ambiguidades que possam advir desse tipo de interpretação são aclaradas com base na apreciação do termo ambíguo no contexto em que ele foi empregado. Comumente, esse termo ambíguo é empregado em contexto diversos, daí o surgimento de dívidas a seu respeito.
“Trata-se de um instrumento técnico, inicialmente a serviço da identificação de inconsistências. Parte-se do pressuposto de que a conexão de uma expressão normativa com as demais do contexto é importante para a obtenção do significado correto. Não obstante as exigências de compatibilidade lógica ocorrem, no entanto, inconsistências quando, às vezes, num mesmo diploma legal, usa-se o mesmo termo em normas distintas com consequências diferentes”[17].

5.3 Método sistemático
Na aplicação do método sistemático, confronta-se uma lei com outras partes da mesma lei ou do mesmo ordenamento, a fim de que sejam esclarecidas possíveis dúvidas.
“A pressuposição hermenêutica é a da unidade do sistema jurídico do ordenamento. Há aqui um paralelo entre a teoria das fontes e a teoria da interpretação. Correspondentemente à organização hierárquica das fontes, emergem recomendações sobre a subordinação e a conexão das normas do ordenamento num todo que culmina (e principia) pela primeira norma-origem do sistema, a Constituição”[18].
5.4 Método teleológico
Segundo o dicionário Aurélio, teleologia é o estudo das finalidades. Então o método teleológico se presta a procurar os fins sociais da aplicação da lei. Procurar-se a finalidade de uma lei, a que ela se refere. Temos aqui uma ideia utilitarista, em que sempre poderemos atribuir um propósito, uma consequência, uma utilidade à lei.
5.5 Método histórico-evolutivo
O método histórico-evolutivo leva em consideração as condições históricas quando da formulação de uma lei, para que daí sejam tiradas conclusões. Podemos também comparar a norma atual coma sua precedente e saber o que levou a esta ser criada e o que mudou e permaneceu da sua criação até os dias atuais.
“Foi especialmente sob a inspiração da Escola Histórica de Savigny que surgiu outro caminho, a chamada interpretação histórica. Sustentaram vários mestres que a lei é algo que representa uma realidade cultural, ou, para evitarmos a palavra cultura, que ainda não era empregada nesse sentido, - era uma realidade histórica que se situava, por conseguinte, na progressão do tempo. Uma lei nasce obedecendo a certos ditames, a determinadas aspirações da sociedade, interpretadas pelos que a elaboram, mas o seu significado não é imutável.
Feita a lei, ela não fica, com efeito, adstrita às suas fontes originárias, mas deve acompanhar as vicissitudes sociais. É indispensável estudar as fontes inspiradoras da emanação da lei para ver quais as intenções do legislador, mas também a fim de ajustá-la às situações supervenientes”[19].
6. Críticas à hermenêutica jurídica
Antes de entrarmos no mérito das críticas, vale lembrar que a maneira de designação de conceitos não é inerte: temos o produtor do texto e temos o intérprete que intenta determinar sentidos válidos a respeito do texto analisado.
Um equívoco presente nos meios hermenêuticos diz respeito à neutralidade do profissional do direito na interpretação de um texto normativo, na melhor inferência a respeito dele e consequentemente na escolha da mais justa, equânime, íntegra e apropriada decisão. Isso não existe.
Não há afastamento suficiente a fim de que seja resolvido um caso concreto de maneira totalmente neutra. O jurista traz consigo convicções inerentes a ele e que independem de com o que ele esteja lidando.
Por mais que uma pessoa tente ser imparcial ou neutro no momento da interpretação, ele jamais o será na sua totalidade, pois sofrerá influências externas do seu momento histórico, da sua cultura, de seus hábitos, etc., visto que nós, na qualidade de seres humanos, estamos sujeitos a isso.
Embora busquemos o modelo autopoiético ideal, sempre seremos permeados por uma certa dose de alopoiese.
7. A renovação da prática hermenêutica
A hermenêutica clássica com suas metodologias e técnicas inexoráveis sofreu críticas devido à crença de que essa “velha” hermenêutica não atendia aos propósitos dos teóricos.
Pregou-se, assim, uma “nova” hermenêutica, com uma maneira de interpretar mais maleável e menos rígida, mas nem por isso a prática clássica deixou de ser usada.
8. O método de interpretação pela lógica do razoável
A lógica formal, por tratar eminentemente de juízos formais não é suficiente para lidar com o direito, uma vez que este se ocupa também com valores. A realidade jurídica é complexa demais para que seja estudada por um simples encadeamento lógico. Seria a ideia de bom senso na prática da interpretação de uma lei, por exemplo, onde não cabem interpretações literais do texto, ou seja, não são admitidas conclusões “ao pé da letra”. Nesse sentido, Miguel Reale[20] coloca que:
“As doutrinas jurídicas mais atuais, como a teoria tridimensional, a da ‘concreção jurídica’, de Karl Engisch, Josef Esser, Karl Larenz e outros; o experiencialismo de Wendel Holmes ou Roscoe Pound; o neo-realismo norte-americano; a "teoria egológica" de Carlos Cossio; o rácio-vitalismo de Recaséns Siches; a teoria da argumentação de Perelman; ou a compreensão integral do Direito de Luigi Bagolini ou de Tullio Ascarelli, demonstram, à saciedade, que a aplicação do Direito não se reduz a uma questão de lógica formal. É antes uma questão complexa, na qual fatores lógicos, axiológicos e fáticos se correlacionam, segundo exigências de uma unidade dialética, desenvolvida ao nível da experiência, à luz dos fatos e de sua prova”. (grifo nosso)
Para ilustrar o supracitado, imaginemos a seguinte situação hipotética: num bar temos uma placa dizendo “proibido som de carro”. Certo dia chega um indivíduo com um micro system com bateria própria no referido bar ligando seu aparelho que faz tanto barulho quanto o som de carro, alegando que seu equipamento não se trata de um som de carro e que, por isso, pode ligá-lo. Pela lógica do racional, esse indivíduo estaria certo, mas é razoável pensar que a placa não prescreve uma proibição específica ao som de carro, e sim a qualquer modalidade de som que possa perturbar a ordem pública. Aqui é a atitude sensata que impera.
Nesse contexto, fica mais do que evidente que o legalismo se torna um caminho profundamente equivocado. O texto em si não se esgota na sua significação. Ele não é universal, embora pretenda isso. São infinitas as possibilidades a que os seres humanos estão sujeitos. É por isso que as regras de 1º grau (as contidas nos códigos dogmáticos do vade mecum) são tão numerosas e voláteis.






Referências Bibliográficas
Referência Primária
BROCHADO, Mariá. Apontamentos sobre hermenêutica jurídica. Revista Jurídica Virtual. Presidência da República (Cessou em 2005. Cont. 1808-2807 Revista Jurídica (Brasília. Online)), v. 13, p. 227-262, 2011.
Referências Secundárias
ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional – sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2008.
______. Ética e Retórica, para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva. 2002.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 20.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. de MACHADO, João Baptista. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999. p.
MACIEL, José Fábio Rodrigues. História da Hermenêutica Jurídica. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=1011>. Acesso em: 15 de abr. 2012
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965.
PALMER, Richard. Hermenêutica. Trad. Maria Luísa Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1969.
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2004.
SALDANHA, Nelson. Ordem e hermenêutica. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.



[1] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1965. p. 13.
[2] MAXIMILIANO, Carlos. op. cit., loc. cit.
[3] SALDANHA, Nelson. Ordem e hermenêutica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 218 – 219.
[4] PALMER, Richard. Hermenêutica. Trad. Maria Luísa Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1969, p. 23.
[5] MACIEL, José Fábio Rodrigues. História da Hermenêutica Jurídica. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=1011>. Acesso em: 15 de abr. 2012
[6] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. de MACHADO, João Baptista. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999. p. 245.
[7] SALDANHA, Nelson. Op. cit. p. 300.
[8] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 256.
[9] ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica, para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 288.
[10] STRUCHINER, Noel. Op.cit.
[11] Idem. Ibidem.
[12] SALDANHA, Nelson. Op. cit. p. 220.
[13] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 277.
[14] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Op. cit. p. 286.
[15] ADEODATO, João Maurício. A construção retórica do ordenamento jurídico – três confusões sobre ética e direito. In: ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional – sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2008.
[16] DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 20.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 204.
[17] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Op. cit. p. 287.
[18] Idem. p. 288.
[19] REALE, Miguel. Op. cit. p. 264 – 265.
[20] REALE, Miguel. Op. cit. p. 283.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

DIREITO CIVIL I - NEGÓCIO JURÍDICO: DEFEITOS

Este trabalho é um resumo do
Cap XIII do Livro Novo Curso de Direito Civil 1 (parte geral) do renomado Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, 15ª Ed. Ano:2013.
Qualquer erro, por favor, me reportem.

7 - DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICO: Neste tópico iremos abordar sobre os vícios existentes em um negócio jurídico que impedem a execução dos negócios com livre manifestação de vontade e boa-fé. Os vícios são divididos em de consentimento e sociais, o primeiro se relaciona a manifestação de vontade enquanto o segundo relaciona-se a boa-fé.

            Vícios de Consentimento;
a)    erro;
b)    dolo;
c)    coação;
d)    lesão;
e)    estado de perigo.

            Vícios Sociais;
a)    simulação;
b)    fraude contra credores.

.           7.1 Erro ou ignorância: Inicialmente temos que nos ater a diferença existente entre erro e ignorância. Erro é cometido por falsa percepção da realidade, ou seja, o agente conhece do objeto, mas não conhece ao ponto de não cair no pecado do erro, enquanto que a ignorância é o momento em que o agente desconhece completamente sobre o objeto.

            O erro só será motivo suficiente para anulabilidade se for essencial e escusável (Art. 138, CC/02), ao dizer essencial estamos nos referindo a essência do objeto, ou seja, sua substância, enquanto que escusável ou perdoável, nos referimos a qual seria a reação de um homem médio sobre aquele determinado negócio.

            Substancial é o erro que incide sobre a substância do objeto, assim ocorre com um colecionador que pretendendo comprar uma estátua de marfim, compra de material sintético.

            Abaixo está enumerado os casos de erros substanciais:
a)    quando interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
b)    quando concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
c)    sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.

            Os erros podem ser em negócio, objeto ou na pessoa.
a)    error in negotio (Art. 139, Inc. I, CC/02): Erro em negócio é aquele que existe na natureza do negócio, assim se você acredita está assinando uma locação, mas na verdade você assina uma procuração;
b)    error in corpore (Art. 139, Inc. I, CC/02): Incide sobre a identidade do objeto em si, imagine que você pretende comprar um gato, mas acaba levando um lebre;
c)    error in substantia (Art. 139, Inc. I, CC/02): Ocorre na substancia do objeto, imagine que você deseja comprar um anel de ouro, mas leva de estanho.
d)    error in persona: Ocorre sobre a identidade ou qualidade de terminada pessoa, imagine que você queira fazer uma doação a maria, imaginando ser ela sua salvadora, mas na verdade quem salvou foi marria

            O erro ainda precisa ser escusável, ou seja, admitido por um homem médio comum. O direito não protege os negligentes, nesse contexto leva-se em consideração o que este homem faz, assim pode se admiti a compra de um diamante falso pensando ser um verdadeiro por um homem normal, mas o mesmo não se pode admiti de um especialista.

            Até o presente momento foi se falado muito sobre os erros de fato e sob a sua conseqüência que seria a anulação do negócio, porém vamos falar agora sobre o erro de direito e suas conseqüências.

            O erro de direito será admitido sempre que houver um erro substancial e escusável e ainda o agente agir de boa-fé, devendo ser invocado de forma comedida uma vez que a LINDB diz "ninguém pode se escusar de cumprir lei, alegando que não a conhece". É preciso que o agente não tenha ciência de que seu ato é ilegal e mais, é preciso que este fator seja determinante para realização do negócio, devendo sempre ser destacada a boa-fé.

            O erro de fato é aquele que age sobre o fato em si, assim um comprador que celebra um contrato pensando comprar ouro puro e na verdade compra ouro não puro, está cometendo um erro de fato, podendo ser o contrato anulado. Já o erro de direito ocorre quando o agente age em inobservância da norma e vai contra a mesma, é o caso de um comprador que promove um contrato de compra e venda de carne da Argentina sem saber que o Brasil não autoriza mais a entrada deste tipo de mercadoria no país, neste caso o negócio deverá ser anulado.

            Ainda tem que se falar da diferença existente entre o erro e os vícios redibitórios, o erro ocorre quando o agente manifesta sua vontade de forma equivocada, ou seja, o erro age no campo do psíquico, diferente dos vícios redibitórios, estes ocorrem quando o agente compra determinado produto por exemplo e na hora que recebe o mesmo vem com defeito, neste caso não houve erro uma vez que o agente tinha a intenção de comprar aquele produto, mas sim uma falha de fábrica, o que define o erro redibitório.

            7.2 Dolo: O dolo ocorre quando um agente ou terceiro age com a intenção de obter para si ou outro certa vantagem, isso ocorre quando um vendedor lhe oferece uma caneta de outro, porém o material é de cobre. É importante saber diferenciar dolo de dolo bonus, este último ocorre quando um vendedor afim de vender seu produto o enaltece a ponto de não cometer infração penal, é o que ocorre numa loja de doces que se declara ter o melhor bolo de chocolate do mundo.

            O dolo ainda pode ser principal ou acidental, neste caso o primeiro causa anulação do negócio (Art. 146, CC/02), enquanto que o segundo só gera a obrigação de ser ressarcido o dano causado.

            Para que seja configurado dolo principal como vício de consentimento, segundo ESPÍNOLA, deve-se observar os seguintes critérios:

a)    finalidade de levar o declarante a praticar um ato jurídico;
b)    gravidade do artifício fraudulento utilizado;
c)    o artifício como causa da declaração de vontade.

            Uma diferenciação básica de dolo principal e secundário é na compra de um celular, imagine que você compra um celular branco, porém recebe um vermelho, neste caso o dolo é secundário, dessa forma deve somente a loja efetuar a troca ou lhe indenizar caso o de cor branca seja mais caro, porém se você comprou o celular somente pelo fato dele ser da cor branca, neste caso o dolo é principal e o negócio deve ser desfeito.

            O dolo ainda pode ser dividido em positivo e negativo, sendo o dolo positivo aquele que em que ocorre através de uma conduta comissiva, onde um vendedor por exemplo ludibria o cliente afim de vender sua mercadoria, já o segundo ocorre em uma conduta omissiva (Art. 147, CC/02), quando o vendedor sabendo por exemplo que tal produto não tinha aquela característica do cliente, ele se omite afim de realizar a venda.

            Segundo VENOSA, são requisitos do dolo negativo:
a)    intenção de levar o outro contratante a se desviar de sua real vontade, induzindo-o a erro;
b)    silêncio sobre circunstância desconhecida pela outra parte;
c)    relação de essencialidade entre a omissão dolosa intencional e a declaração de vontade;
d)    omissão do próprio contraente e não de terceiro.

            O legislador ainda adicionou ao dolo o caso de dolo por terceiro, neste momento um terceiro com o intuito de produzir certa vantagem, age com dolo, neste caso o legislador previu (Art. 148, CC/02) que deve ser analisado o envolvimento do vendedor ou outra parte.

            Imagine uma compra de um quadro real intermediado por Jorge, Matheus é um grande pintor de réplicas e produz uma réplica idêntica daquela que Alceu pretende adquirir, neste caso teremos várias hipóteses, entre elas:

            Jorge e Matheus agiram com dolo ou Jorge agiu com dolo, mas Matheus poderia ter percebido mediante as circunstancias, neste caso ambos respondem pelo dano causado, porém se só Jorge agiu com dano e Matheus pela sua boa-fé não percebeu que entrava em uma armação, somente Jorge deverá ressarci Alceu.

            Em caso de representação legal o representado só poderá ser responsabilizado até a importância do proveito que obteve (Art. 149, CC/02).

            7.3 Coação: Enquanto que o dolo age no campo psíquico do agente, a coação é o dano causado no campo psíquico ou exterior, podendo ela ser: física ou moral.

            Coação física é causada aquela causa mediante emprego da violência física sobre o agente, neste caso ela não gera anulação do negócio jurídico, é entendido que o negócio jurídico nunca existiu, sendo inexistente, uma vez que ela não vicia a manifestação de vontade da vítima e sim a neutraliza.

            A coação moral por sua vez, age no vicio da manifestação de vontade da vítima, dessa forma a vítima age não por livre vontade, mas por alguma forma de pressão psíquica.

            A coação pode ser contra a vítima diretamente, seus bens, algum membro de sua família, ou até mesmo contra um outro qualquer, cabendo ao juiz decidir sobre a coação (Art. 151, CC/02).

            Durante o apreciar da coação deve ser observada a qualificação do homem médio comum, devendo se observar sexo, idade, condição, saúde, até mesmo o temperamento, uma vez que não se imagina haver coação na situação de uma velhinha obrigar um homem de 2 metros de altura a assinar um documento.

            Ainda temos alguns casos que não se considera coação, como o temor referencial ou a ameaça de exercício normal de um direito, neste caso não pode se imaginar coação quando um pai induz um filho a comprar certo terreno, porém se este pais se utiliza de chantagem, dizendo ao filho que caso ele não compre o afastará da família, neste caso existe segundo PONTES DE MIRANDA um plus, fazendo com que tal conduta seja considerada como coação. O mesmo ocorre quando um agente no uso de seus direitos ameaça um outro, imagine o caso de um inadimplente que é ameaçado pelo seu credor, caso ele não pague a divida o credor vai colocar o mesmo nos órgãos de proteção ao credito, neste caso não é coação.

            Com relação a coação por terceiro se aplica regras semelhantes ao dolo por terceiros.

            7.4 Lesão: Lesão seria o dano causado a um agente que age por premente necessidade ou por inexperiência, em que fica essa pessoa obrigada a prestação de valor desproporcional com a realidade, sendo a mesma divida em objetivo ou material e subjetivo, imaterial ou anímico.

            A lesão objetiva é aquela ocasionada pela desproporção das prestações, enquanto que a lesão subjetiva é ocasionada por premente necessidade, a inexperiência ou a leviandade e o dolo de aproveitamento da parte beneficiada (PABLO STOLZE).

            7.5 Estado de Perigo: O estado de perigo aparece como um defeito do negócio jurídico e também é incorporado ao plano de validade. É imprescindível que se perceba a distinção existente entre coação, lesão e estado de perigo.

            No estado de perigo a vítima se vê obrigada a realizar tal negócio como única forma de proteger seus bens, familiares e amigos, diferente da coação, a vítima age de forma voluntária e estabelece um negócio jurídico extremamente oneroso, afim de evitar um dando aos seus, caso isso ocorra ela pode se recusar a cumprir com o prometido, uma vez que ela só o fez graças ao perigo iminente.

            Imagine o exemplo em que um homem se compromete a pagar uma cara cirurgia em um hospital particular, sendo essa a única forma de salvar sua pequena filha, ou uma pessoa que promete doar toda sua herança pra quem salvá-la de um naufrágio, esses casos são exemplos claros de uma situação extremamente perigosa em que a pessoa oferece uma recompensa bem onerosa para salvar-se, diferente da coação onde ela é ameaça.

            7.6 Simulação: A simulação ocorre quando o agente pretende atingir um fim seja ele lícito ou não e para isso se utiliza de uma simulação de um negócio qualquer, essa simulação tem aparência normal, mas na verdade objetiva produzir não aquele resultado aparentado. A simulação ainda pode ser absoluta e relativa.

            Simulação absoluta é aquela em que se objetiva a realizar um negócio jurídico que não produzirá nenhum efeito jurídico, é o que ocorre quando tentando evitar que os bens do casal sejam partilhados, o marido doa parte dos bens para um amigo, simulando um contrato de compra e venda, afim de que após a separação o amigo devolva os bens ao mesmo, neste caso todo o negócio seja nulo, além disso o negócio jurídico é completamente perfeito, uma vez que ele não infringi a lei.

            Simulação relativa é aquela em que o agente realiza um negócio jurídico ilegal com a intenção de produzir certos efeitos jurídicos, é o que ocorre quando um homem pretende doar parte de sua fortuna a sua concubina, sendo este ato considerado ilegal por lei, ele realiza a transferência a um terceiro que por sua vez vai doar a sua concubina, neste caso o ato será invalidado.

            Ainda sobre a simulação é importante ressaltar sobre a reserva mental, a mesma ocorre quando o agente declara uma intenção, mas na verdade seu objetivo é atingir uma outra, imagine o exemplo em que um ator pretende ganhar pontos publicitários e resolve promover um evento declarando que todo o recurso daquele evento será destinado a um orfanato, pouco importa a real intenção do ator, o importante é se ele cumprirá com o que diz.

            A reserva mental adquirirá caráter de simulação quando ela for exteriorizada, é o que ocorre quando um agente pretende adquirir cidadania brasileira e para isso resolve se casar com uma brasileira, desde o início ele não tinha a intenção de casar e sim adquirir a cidadania, neste caso o ato não passa de uma simulação.

            7.7 Fraude contra credores: Assim como a simulação a fraude contra credores aparece como um vício social, e consiste em uma manobra realizada por um agente com o objetivo de lesionar seu credor, considerando que o agente se encontra falido ou está perto de sua falência ele decidi por doar seus bens ou perdoar divida alheia, devendo os credores quirografários solicitarem que o ato seja anulado (Art. 158, CC/02).

            A fraude contra credores é composta por dois elementos, sendo o primeiro de natureza subjetiva e o segundo de natureza objetiva: consilium fraudis (o concílio fraudulento) e evetus damni (o prejuízo causado ao credor).

            O ato que declara a anulação de tal negócio é chamada de ação pauliana, devendo ser invocada pelos credores quirografários, ou seja, aqueles que não tem nenhuma garantia ou segurança de que receberão numerário equivalente a seu credito, além disso só os credores que já eram a tempo de tal negócio é que poderão solicitar tal ação (Art. 158, § 2, CC/02).

            Os fundamentos da referida ação são as seguintes:
a)    negócios de transmissão gratuita de bens (Art. 158, CC/02);
b)    remissão de dívidas (Art. 158, CC/02);
c)    contratos onerosos do devedor insolvente, em duas hipóteses (Art. 159, CC/02), quando a insolvência for notória ou quando houver motivo para ser conhecida do outro contratante.
d)    antecipação de pagamento feita a um dos credores quirografários, em detrimento dos demais (Art. 162, CC/02).
e)    outorga de garantia de dívida dada a um dos credores, em detrimento dos demais (Art. 163, CC/02).

            A doutrina também previu os casos em que os negócios feitos com um insolvente será considerado válido, são os casos acobertados pelo (Art. 164, CC/02), negócios ordinários indispensáveis à manutenção do estabelecimento mercantil, ...), neste caso se um devedor insolvente realizar um negócio de boa-fé e com o intuito de salvar seu estabelecimento, este será considerado válido.

            Uma vez anulado o negócio jurídico a vantagem resultante reverterá em proveito do acervo do devedor (Art. 165, CC/02), nesta parte temos grande confusão entre as doutrinas, algumas entendem que uma vez anulado os negócios, este voltando imediatamente e se tornam novamente bem do devedor, já outra entende que os atos são passíveis de anulabilidade, ou seja, os atos que não prejudicam credores anteriores não seriam revogados, somente devem ser anulados os atos, fazendo com que não sejam incorporado aos bens como defende a doutrina anterior e sim passíveis de serem executados.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III - Teoria dos Recursos

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