sábado, 23 de novembro de 2013

DIREITO CIVIL I - NEGÓCIO JURÍDICO - Plano de Eficácia e Prova do Negócio

Este trabalho é um resumo do
Cap XV e XVI do Livro Novo Curso de Direito Civil 1 (parte geral) do renomado Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, 15ª Ed. Ano:2013.
Qualquer erro, por favor, me reportem.

12 – CONCEPÇÃO DO PLANO DE EFICÁCIA DE UM NEGÓCIO JURÍDICO: Este plano tem como função verificar se o negócio jurídico pretendido pela declaração de vontade foi objetivamente eficaz naquilo que se declarou. Alguns elementos podem impedir sua eficácia, veremos mais abaixo sobre os mesmo.
13 – ELEMENTOS ACIDENTAIS LIMITADORES DA EFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO: São eles:
a)    O termo;
b)    A condição;
c)    O modo ou encargo.
É importante frisar que até mesmo os atos nulos, produzem efeitos jurídicos e devem ser avaliados pelo plano de eficácia.
13.1 Condição: A condição é um elemento que atua na declaração de vontade do indivíduo, fazendo com que um negócio jurídico só produza seus efeitos após ser cumprido com alguns pré-requisitos. Ainda são considerados elementos essenciais da condição a incerteza e a futuridade (Art. 121, CC/02).
Dessa forma só pode ser fator condicional aquele que for incerto, imagine um exemplo em que você planeja transferir seus bens, caso ganhe na loteria, esse fator é rodeado de incerteza, logo ele é condicional. A questão da morte é tratada muitas vezes como um termo, uma vez que a morte não é incerta, todo sabemos que um dia iremos morrer, ou seja, essa incerteza atua no campo da realização do próprio fato e não no período de tempo que ele irá se realizar, é preciso ser incerto a realização do fato. Pode sim ocorrer de um fato morte vim a ser considerado condição, para isso é preciso fixar um tempo de incerteza, imagine que você quer comprar um carro caso seu tio morra em 4 anos, neste caso é incerto se tal fato vai se concretizar naquele período.
Outra característica da condição é a futuridade, não existe condição de um fato passado, exemplo muito utilizado é o que você promete doar parte de sua fortuna se foi premiado na loteria no sorteio de ontem, observe que o sorteio já passou, logo não teremos respeito à futuridade.
A condição ainda pode ser divida em suspensiva e resolutiva. A primeira ocorre quando um ato jurídico tenha seus efeitos deflagrados, ou seja, se iniciam a partir daquele momento, já a resolutiva ocorre quando os efeitos desaparecem.
Sobre a condição suspensiva é importante lembrar que não somente se condiciona a ela a eficácia do negócio, mas também os direitos e deveres oriundos do mesmo, exemplificando, se você celebra um contrato de compra e venda com outro, enquanto não se verificar, você não terá adquirido o direito que ele visa (Art. 125, CC/02).
Sobre a condição resolutiva, o negócio permanece ativo até que ela seja cumprida (Art. 127, CC/02), ainda sobre é sabido que a condição resolutiva se sobressai, extinguindo direitos que forem de encontro a ela, mas se for um negócio de execução continuada ou periódica, a sua realização não tem eficácia quanto aos atos já celebrados, desde que seja notada boa-fé e os atos tenham natureza compatível com a condição pendente (Art. 128, CC/02), bom exemplo é elencado por PABLO STOLZE, imagine um universitário que depende da venda de gado até que tenha colado grau, logo a condição resolutiva (colação de grau) não cancela os contratos já firmados antes, ficando pendente apenas a entrega dos gados.
Pode ser ainda a condição resolutiva ser expressa ou tácita, bem como positiva ou negativa, sendo a positiva aquele que aparece no momento que surge um fato, ao posto que a negativa é o contrário, é aquela que existe até o momento que se verifique o fato.
As condições podem ser lícitas ou ilícitas, são reputadas além das ilícitas, as perplexas e potestativas (Art. 122, Parte Final, CC/02). Condição perplexa é aquela incompreensível ou contraditória, imagine um contrato de aluguel de um carro, porém como condição o locador não poderá dirigir o mesmo, esse tipo de condição é motivo de invalidade do negócio jurídico (Art. 123, Inc. III, CC/02), temos ainda a chamada condição puramente potestativa, esta existe quando é notado o arbítrio de uma das partes, imagine um contrato de aluguel, que tenha uma clausula onde o locatário define que o valor poderá ser reajustado quando for de seu interesse, nesse caso nota-se a presença do fator subjetivo “eu quero”, diferente do que ocorre na condição simplesmente potestativa, esta última é aceitável, ela ocorre quando não só a vontade é fator suficiente para sua concretização, a exemplo é um patrocinador que promete financiar um atleta caso ele ganhe a competição, a vontade do atleta de ganhar não é fator único para o estabelecimento de tal resultado.
Por fim temos ainda as condições fisicamente ou juridicamente impossíveis, um exemplo de condição fisicamente impossível é obrigar uma das partes a dar uma volta ao redor do Recife em dois minutos, sendo constatada essa irregularidade ela será motivo de nulidade absoluta por contrariar norma expressa (Art. 123, Inc. II, CC/02) em combinação com (Art. 166, Inc. VII, CC/02), já as juridicamente impossíveis, são aquelas que não se podem realizar no campo jurídico, é o que ocorre quando se promete uma doação caso o sujeito case com três mulheres em cartório. Ainda temos que em casos de condição resolutiva ou for de não fazer coisa impossível, esse negócio será considerado inexistente nos termos do (Art. 124, CC/02).
13.2 Termo: O termo consiste num ato jurídico futuro e certo, que subordina o início ou fim da eficácia do negócio jurídico.
      O termo pode ser final ou inicial, no caso do termo final as partes definem como motivo de suspensão do negócio aquele termo, já no caso de termo inicial as partes fazem justamente o contrário, sendo os direitos e deveres iniciados a partir do cumprimento daquele termo (Art. 131, CC/02).
O termo poderá ser certo ou incerto, no primeiro se conhece exatamente o momento que tal ato se dará, enquanto que no segundo só se sabe que ele acontecerá, mas não o dia ao certo.
A diferença existente entre o termo inicial e final é denominada de prazo (Art. 132, CC/02), nos testamentos o prazo é em favor dos herdeiros e em caso de contratos, em favor do devedor (Art. 133, CC/02).
Caso seja feito um negócio jurídico sem prazo, ele deverá ser cumprido de logo, salvo se a execução tiver de ser feita em local diverso ou depender do tempo (Art. 134, CC/02).
Por fim tem-se que a doutrina divide os termos em: convencional, legal e de graça, sendo o primeiro estabelecido pelas partes, o segundo por força de lei e o terceiro por decisão judicial.
13.3 Modo ou encargo: O modo ou encargo é uma determinação que impõe ao beneficiário do negócio jurídico, certo ônus. Imagine que você deseja doar um terreno a prefeitura, você explicitamente informa que deverá a prefeitura construir ali uma escola, neste caso o não cumprimento do encargo não interfere na aquisição de direito, somente gera uma posterior cobrança por meio judicial, salvo se for condição suspensiva (Art. 136, CC/02).
Em caso de encargo ilícito ou impossível, considera-se como não escrito, neste caso se mantém o ato na sua forma pura, é o caso de uma doação em que o sujeito se vê obrigado a viajar até saturno. Pode ocorrer também de o motivo ilícito ou impossível ser causa da liberalidade, isso ocorre quando uma doação tenha como objetivo a instalação de um prostibulo, neste caso deverá ser o negócio invalidado como um todo (Art. 137, CC/02).
14 – PROVA DO NEGÓCIO JURÍDICO: O negócio jurídico como visto anteriormente é validado, existente e até sujeito a provação de sua eficácia. No direito Romano, os negócios eram repletos de grande formalismo que servia não só para validar o negócio, bem como para dar um ar de positividade.
Com o direito Brasileiro é diferente, parte desse formalismo ficou para trás, sendo em muitos casos somente necessário a manifestação de vontade, independentemente da prova formal.
            Em alguns casos do direito moderno, a prova formal ainda é exigida como maneira de validação de um negócio jurídico, é o que ocorre num negócio de compra e venda de um terreno, somente será considerado vendido se a venda foi devidamente registrada em cartório, caso contrário o negócio é absolutamente nulo.
            Em termos de distinção conceitual entre prova e forma, temos que a prova é o meio pelo qual se constata a veracidade do negócio, ao passo que a forma, é o modo pelo qual é aplica a prova.
15 – PROVAS, EM ESPÉCIE, DO NEGÓCIO JURÍDICO: Salvo nos casos que a lei exigir como prova um ato formal, a lei adotou alguns critérios prescritos no (Art. 212, CC/02) para servir como prova de qualquer negócio jurídico, são eles:
a)    Confissão;
b)    Documento;
c)    Testemunha;
d)    Presunção;
e)    Perícia.
15.1 Confissão: A confissão era tida antigamente como a rainha das provas, uma vez que a mesma tem como definição jurídica, um ato no qual beneficie outra parte em prejuízo do próprio confessor. É o caso do homem que confessa ter simulado um negócio com seu amigo.
Porém a confissão pode ser carregada de atos que anulam a mesma, como nos casos em que a pessoa que confessou não é capaz (Art. 213, CC/02) ou seu representante não tem legalidade para tanto (Art. 213, Parágrafo Único, CC/02).
Sendo a confissão ato irrevogável, temos alguns casos em que na confissão admite-se anulação, como na: coação ou erro de fato (Art. 214, CC/02), coação ocorre quando o agente por questões morais obriga um agente a declarar, neste caso o ato será anulado, bem como nos casos em que houver erro de fato onde a pessoa confessa uma situação, mas age equivocadamente, quando na verdade se tratava de outra, equivocando-se quanto à natureza do negócio, suas qualidades essenciais, seu objeto, ou quanto à pessoa do outro declarante. Por fim temos os casos de coação física, neste caso será considerado inexistente o ato.
É importante salientar também que a confissão a luz do Código de Processo Civil (Art. 354), não poderá ser utilizada de forma divida, ou seja, nos casos de benefício deverá ser utilizada como um todo, bem como nos casos prejudiciais, não podendo se utilizar de partes.
15.2 Documento: Documento é um escrito representativo de um determinado fato jurídico (PABLO STOLZE), dessa forma é um meio de prova no qual os interessados escrevem aquilo que desejam resguardar como direito. Podendo ser público ou particular, sendo o primeiro aquele que é formado por oficial público, no exercício de suas funções e na forma da lei ou quando é formado por particulares.
Importante à divisão entre documento e instrumento, costuma-se aceitar que instrumento é espécie, enquanto que o documento é o gênero, em outras palavras, instrumento seria uma espécie de documento, como por exemplo nos casos de compra e venda de um imóvel, o termo lavrado pelo oficial público, nada mais é do que um instrumento público.
Outra característica do instrumento é que ele serve como uma prova pré-constituída, ou seja, o fato daquele instrumento existir já serve como uma prova do negócio, por exemplo, imagine um instrumento público que seria uma escritura de compra e venda a causa pré-constituída é a prova de alienação onerosa.
Se houver a necessidade de autorização para validade do ato, este tem que constar no próprio instrumento (Art. 220, CC/02), imagine o exemplo em que você outorga uma procuração a seu advogado para que o mesmo venda sua casa, neste momento deverá a procuração constar em instrumento público, por que esta é a forma exigida para validade desta espécie de alienação.
Em caso de instrumento particular, o mesmo só terá efeito se for devidamente registrado no registro público (Art. 221, CC/02), porém alguns casos não se aplicam como a compra e venda de um automóvel, por exemplo, é um instrumento particular que não precisa ser registrado em registro público.
O SFT entendeu que a compra e venda de automóvel não deve prejudicar o vendedor, mesmo que ele não tenha registrado em cartório a venda, um exemplo claro é o comprador atropelar alguém e alegar não ser ele o motorista em virtude dele não ter comprado o carro, isso é repugnado pelo ordenamento, é a chamada responsabilidade extracontratual ou aquiliana.
Além das provas citadas anteriormente, também servirão como provas o transcrito no (Art. 216, CC/02), (Art. 217, CC/02), (Art. 218, CC/02), (Art. 222, CC/02), (Art. 223, CC/02), (Art. 225, CC/02) e (Art. 226, CC/02).
Outro ponto muito importante é com relação a aceitação como prova os documentos oriundos de xerox, para STOLZE é completamente inaceitável que uma xerox (traslado) não seja aceita como documento comprovatório, uma vez que vivemos na sociedade dos grandes avanços e é cada vez mais necessário e comum tirar proveito dos avanços tecnológicos de nossa era, a respeito disso temos o (Art. 222, CC/02) que fala sobre os telegramas, sendo eles aceitos como prova, caso sejam contestados então deverão ser colocados a conferência com o original, observe que o telegrama já é aceito, só sendo verificado se for contestado.
Por fim o (Art. 224, CC/02) traz que os documentos estrangeiros devem ser traduzidos para língua local, afim de que possam ser compreendidos.
15.3 Testemunha: A testemunha é um meio pelo qual pode se provar um negócio jurídico, porém este meio é bastante questionado e evitado, uma vez que depende de pessoas e essas pessoas podem desvirtuar seus depoimentos, pensando nisso o (Art. 227, CC/02) diz que só será admitida como prova única e exclusivamente testemunhal os casos em que o negócio não ultrapasse o valor de 10 (dez) salários mínimos, sendo porém admitida em qualquer negócio, desde que seja prova complementar, salvo se uma das partes declarar que não tem nenhum outro tipo de prova (Art. 402, CPC). Ainda temos alguns casos que esta regra é aplicada com certa razoabilidade, exemplo claro são as causas relativas a negócios trabalhistas, é sabido que muitas vezes o funcionário assina certos documentos que não condizem com a realidade, ou ainda pior, muitas vezes não assinam nada.
A testemunha declarada em documento é chamada de instrumentária, ao passo que aquela chamada em juízo é judicial.
Importante o (Art. 228, CC/02) que traz os casos em que a testemunha não poderá ser utilizada como prova, o mais importante desse Artigo é o seu parágrafo único, que permite que as mesmas testemunhas sejam utilizadas como provas, se essas forem as únicas a conhecer tal fato.
O (Art. 229, CC/02) elenca alguns casos em que a testemunha não se vê obrigada a testemunhar.
15.4 Presunções: A presunção nada mais seria que uma prova oriunda de outra prova conhecida, imagine um caso em que você realiza pagamento mensal de uma dívida, o pagamento da última presume que a dívida se extinguiu.
As presunções podem ser legais ou comuns, dentre as legais temos as absolutas (juris et de jure) e as relativas (juris tantum).
As presunções legais absolutas são causas de certeza jurídica, cabendo somente provar o dano, exemplo é a fraude contra credores, onde se presume que o agente agiu de má-fé (consilium fraudis), neste caso falta somente provar o tamanho do dano (eventos damni).
Nos casos de presunções legais relativas, estas são mais comuns e admitem provas em contrário.
Ainda tem os casos das presunções comuns, aquelas que não estão previstas em legislação, porém são aplicadas, é o que acontece, por exemplo, nas cidades do interior, onde existe o dia da feira, o magistrado através de sua experiência local, extrai aquela presunção.
Não será admitida presunção conforme preceito do (Art. 230, CC/02), nos casos em que não for aceito prova testemunhal.
15.5 Perícia: A perícia também é admitida como prova e os encarregados de realizarem a mesma são sujeitos que atuam para a justiça (bem público). O (Art. 231, CC/02) preceitua que aquele que se recusar a passar por perícia não poderá aproveitar-se de sua recusa, bem como aquele que se recusar a submeter-se a perícia, excluirá aquela como prova (Art. 232, CC/02).
Um exemplo claro é de um sujeito que se negou a fazer exame de DNA alegando ter grave temor à agulha, neste caso a juíza determinou que fosse feito o exame mesmo por força de coerção, o sujeito impetrou um habeas corpus e o caso chegou ao STF, onde foi concedido, uma vez que a agulha feria o direito a personalidade do agente (intangibilidade do corpo humano), porém tal fato fez com que se presumisse ser ele o pai, uma vez que ele se recusou daquele exame que poderia livrá-lo da presunção, suprindo a prova em contrário que se poderia obter (Art. 232, CC/02).
16 – CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE A PROVA: Por fim trago um assunto bastante contemporâneo, que é a prova obtida de forma ilegal. Para muitos essa prova não deve ser utilizada em juízo, mas isso não é verdade, em alguns casos se admite sim o uso de tais provas, mesmo que aquele que se apropriou da mesma de forma ilegal responda posteriormente por seus atos.
            O que deve ser levado em consideração, é o dano ao bem jurídico, imagine um caso em que uma ação de paternidade a única prova obtida seja um diário assinado pelo pai em que confessa ser aquele seu filho, esse diário obtido de forma ilegal fere o direito do pai a privacidade, porém o filho também teu seu direito a um pai, uma herança, uma pensão alimentícia, neste caso deve o magistrado pesar o dano daquela prova com muita parcimônia.

Aqui terminamos negócio jurídico, bom estudo e boa sorte.

DIREITO CIVIL I - NEGÓCIO JURÍDICO - Invalidade do Negócio


Este trabalho é um resumo do
Cap XIV do Livro Novo Curso de Direito Civil 1 (parte geral) do renomado Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, 15ª Ed. Ano:2013.
Qualquer erro, por favor, me reportem.


8 - INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO: Anteriormente estudamos os defeitos dos negócios jurídicos e suas conseqüências, neste tópico abordaremos sobre essas conseqüências no plano das validades, uma vez que o código civil resguardou em artigo próprio a matéria em questão, visto como de grande importância.

            A nulidade de um ato jurídico pode ser absoluta (ato nulo) ou relativa (ato anulável), os atos nulos são aqueles relacionados com a natureza pública do negócio, já os relativos são de natureza particular.

            É importante ressaltar que a nulidade de um ato jurídico não implica na nulidade do negócio como um todo, uma vez que descartado o ato invalido pode ser aproveitado alguma coisa do negócio e o mesmo pode ser provado de outra forma que existe (Art. 183, CC/02), além disso de acordo com o princípio da conservação uma obrigação secundária anulada não interferiria na obrigação principal.

9 - NULIDADE ABSOLUTA: Abaixo será listada as causas de nulidade absoluta dos negócios jurídicos (Art. 166 e 167, CC/02).

   a)    Celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
   b)    For ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
   c)    O motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
   d)    Não revestir a forma prescrita em lei;
   e)    Preterir alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
    f)     Tiver por objeto fraudar a lei imperativa;
   g)    A lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção;
   h)   Tiver havido simulação.

            É importante ressaltar o item que cita a fraude como um motivo de nulidade absoluta, já foi visto que a fraude contra credores é uma das causas de vício do negócio jurídico, porém não é este o motivo pretendido pelo legislador no (Art. 166, Inc. VI, CC/02), a fraude citada no referido artigo diz respeito a in fraudem legis, que seria a fraude contra a lei.

            Os casos supracitados de nulidade, podem ser requeridos por qualquer pessoa a quem interessar ou o ministério público quando lhe couber, devendo o juiz declarar de ofício, devendo ainda o juiz declará-la sempre que encontrar alguma causa de nulidade, não podendo o mesmo supri-las, mesmo que a requerimento dos interessados (Art. 168, CC/02).

            Sobre a prescritibilidade de um negócio jurídico nulo, o ordenamento afirma ser imprescritível (Art. 169, CC/02), ainda é importante salientar que a nulidade deve ser declarada, caso não seja, o negócio permanecerá ativo até que o juiz o faça.

            Ainda sobre a imprescritibilidade temos que ela só ocorre quando a intenção da petição for exclusivamente declaratória de nulidade, caso seja requisitado ressarcimento ou mesmo condenação penal, neste caso o negócio passa a ser prescritível nos termos da lei.

            Já vimos que ao solicitar que o ato seja declarado com nulo, devemos nos ater as conseqüências dessa declaração, quando for simplesmente declaratória a mesma é imprescritível, já aqueles que visam de alguma forma ressarcimento oneroso passa a ser prescritível, é importante ressaltar também sobre os efeitos da nulidade, o ato nulo possui efeito ex tunc, ou seja, retroage até o momento inicial do negócio. Para compreender melhor imagine uma contratação de um trabalhador por um menor de idade, neste caso é um motivo de nulidade absoluta, uma vez que o menor não tem capacidade para efetuar tal contratação, passado um tempo o contratado resolve solicitar a declaração de nulidade daquele contrato e o ressarcimento do mesmo, neste caso será permitido o ressarcimento e o negócio ainda continua tendo sua pretensão imprescritível, uma vez que anulado tal negócio é preciso que o mesmo volte a condição que se encontrava anteriormente, não sendo possível por motivos óbvios, só resta ao juiz declarar a nulidade e indenizar o contratado por sua mão de obra utilizada, retornando ao status quo ante.

10 - NULIDADE RELATIVA: A nulidade relativa como já foi citada, é aquela em que o bem jurídico atacado é geralmente particular, ou seja, ele não interessa tanto quanto o bem público para o direito, por isso ele detém o status de anulabilidade.

            Nesse sentido cuida o ordenamento jurídico em seu (Art. 171, CC/02) de elencar os casos de nulidade relativa, além dos casos previstos em lei, sendo eles: por incapacidade relativa do agente e por vício resultante de erro, dolo, estado de perigo, coação, lesão ou fraude contra credores.

            Neste caso não pode o juiz reconhecer de ofício, cabendo a parte lesada procurar seus interesses, devendo entrar com a chamada ação anulatória de negócio jurídico em um prazo máximo de 4 (quatro) anos (Art. 178, CC/02) ou 2 (dois) anos em caso de que a lei dispuser como fator de anulação e não citar prazo (Art. 179, CC/02).
            No que tange a questão da anulação de um negócio jurídico em se tratando de princípios, temos o chamado princípio da conservação que visa manter o negócio jurídico viciado, porém livre do vício que o tornava anulável. Este princípio pode ser acessado desde que ambas as partes declarem interesse (medidas voluntárias), ou em casos que a própria lei o diga (medidas involuntárias) como a pretensão de prescrição, por exemplo, (Art. 172, CC/02).
            A confirmação de manutenção do negócio jurídico acima citado (viciado) poderá ser de forma expressa, neste caso as partes expressam claramente e objetivamente seu desejo de reafirmarem todos os termos do negócio jurídico, essa declaração deverá constar ainda a substância e a vontade expressa de manter o negócio (Art. 173, CC/02), ainda temos a declaração de forma tácita, neste caso não é declarada de forma clara que existe intenção de manter o negócio, porém os atos das partes, cientes de que o negócio é viciado, demonstram que elas têm interesse em manter ativo tal negócio, uma vez que uma ou ambas as partes cumprem com suas obrigações (Art. 174, CC/02).
            Uma vez confirmado o negócio por via expressa ou tácita, extingue-se todas as ações ou exceções, de que contra ele dispusesse o devedor (Art. 175, CC/02), ainda temos que sendo a falta de autorização de um terceiro o motivo de anulabilidade de um negócio, este será confirmado se o terceiro a der posteriormente (Art. 176, CC/02).
            Em síntese a anulabilidade não tem nenhum efeito antes de ser julgada por sentença e não pode o juiz se pronunciar de ofício (Art. 177, CC/02), além disso temos os casos em que o ordenamento trata do menor, sendo declarado que o menor não pode se eximir de uma obrigação, invocando sua idade, se dolosamente a ocultou quando inquerido pela outra parte ou no ato de obrigar-se declarou-se maior (Art. 180, CC/02), ainda não pode ninguém reclamar de ter pago a um menor, por uma ação anulada, se não provar que reverteu em proveito dele a importância paga (Art. 181, CC/02).
            Finalmente falaremos dos efeitos de uma ação anulatória de um negócio anulável, em caso de concebida a devida ação, ela será considerada desconstitutiva ou constitutiva negativa, isso quer dizer que, a luz do que prega o código de processo civil, os efeitos anteriores seriam mantidos e os efeitos anulatórios contariam a partir daquele momento (ex nunc), porém para o professor PABLO STOLZE, isso é uma inverdade, uma vez que imagine o exemplo de um negócio feito sobre o vício da lesão em que você se vê obrigado a pagar um sinal (arras) de 15.000 (quinze mil reais), uma vez anulado futuramente o negócio é de se esperar que seus efeitos sejam anulados desde o início do negócio e seu arras seja restituído, ou seja, efeitos (ex tunc) (Art. 182, CC/02), nessa linha de pensamento cumpre citar o Prof. HUMBERTO THEODO JÚNIOR que defende:
            “São casos especiais de sentença constitutiva: a) sentença que anula o ato jurídico por incapacidade relativa do agente, ou vício de erro, dolo, coação, simulação ou fraude, porque sua eficácia é ex tunc em decorrência do art. 158 do Código Civil, que manda, in casu, sejam as partes restituídas ao estado em que se achavam antes do ato anulado”.
Humberto Theodoro Júnior, Curso de Direito Processual Civil, 18. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1996, v. I, p. 519.
            Terminando tal resumo e para melhor fixar o que aqui foi dito, abaixo segue uma tabela extraída deste livro:
NULIDADE ABSOLUTA
NULIDADE RELATIVA
O ato nulo atinge interesse público superior.
O ato anulável atinge interesses particulares, legalmente tutelados.
Opera-se de pleno direito.
Não se opera de pleno direito.
Não admite confirmação.
Admite confirmação expressa ou tácita.
Pode ser arguida pelas partes, por terceiro interessado, pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir, ou, até mesmo, pronunciada de ofício pelo juiz.
Somente pode ser arguida pelos legítimos interessados.
A ação declaratória de nulidade é decidida por sentença de natureza declaratória de efeitos ex tunc.
A ação anulatória é decidida por sentença de natureza desconstitutiva de efeitos ex tunc.
Pode ser reconhecida, segundo o Novo Código Civil, a qualquer tempo, não se sujeitando a prazo prescricional ou decadencial.
A anulabilidade somente pode ser arguida, pela via judicial, em prazos decadenciais de quatro (regra geral) ou dois (regra supletiva) anos, salvo norma específica em sentido contrário.
11 – CONVERSÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO: A conversão de um negócio jurídico nulo ou anulável é uma medida que visa respeitar o princípio da conservação, em que um negócio mesmo viciado ou nulo de pleno direito, poderia ser convertido em outro observando os preceitos formais e materiais.
            Imagine uma nota promissória nula por inobservância dos requisitos legais, seria aproveitada como compromisso de dívida, por exemplo.

            A conversão ainda exige alguns pressupostos como o material e o imaterial. No primeiro aproveitam-se os elementos fáticos do negócio inválido, enquanto que no segundo aproveita-se a intenção dos declarantes direcionada à obtenção da conversão negocial.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

HERMENÊUTICA - Aspectos introdutórios e métodos de interpretação

1. Aspectos iniciais
A hermenêutica é a ciência que determina os fundamentos, regras e maneiras de interpretação. No seu campo de atuação, trata do princípio da interpretação de símbolos, sinais, leis, normas, etc.

No início do nosso estudo, cumpre salientarmos a colocação de Carlos Maximiliano, que entendia que a Hermenêutica Jurídica tinha por “objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito”[1]. Para Maximiliano, a Hermenêutica qualificava “a teoria científica da arte de interpretar”[2].

Nelson Saldanha[3] coloca que:

“O surgimento de uma teoria da hermenêutica se tornou possível quando se conheceu a história dos diversos modos de interpretar, e quando o próprio interpretar foi entendido como um processo abrangedor de componentes objetivos e subjetivos. Ela surgiu em ligação com a filosofia e a arqueologia, os métodos comparativos e a filosofia sistematizante: surgiu com Schleiemacher, com Böckh, com o próprio Nietzsche e depois com Dilthey”.

Quanto à etimologia, Richard Palmer[4] coloca que o termo hermenêutica lembra o verbo grego hermeneuein (que significa interpretar) e também o substantivo hermeneia (traduzido como interpretação).

Em seu artigo, José Fábio Rodrigues Maciel[5] afirma que:
“Há correntes que apontam a origem do nome ao deus grego Hermes, filho de Zeus com Maia, sendo, nesse caso, associado à função de transmutar aquilo que estivesse além do entendimento humano em uma forma que a inteligência humana pudesse compreender. Hermes traduzia as mensagens do mundo dos deuses para o mundo humano. Sua figura era tão marcante que foi atribuído a ele a descoberta da linguagem e da escrita, e sua função de mensageiro sugere, na origem da palavra hermenêutica, o processo de trazer para a compreensão algo que estivesse incompreensível”.

Por sua vez, Kelsen[6] declara que:
“A interpretação é, portanto, uma operação mental que acompanha o processo da aplicação do Direito no seu progredir de um escalão superior para um escalão inferior. Na hipótese em que geralmente se pensa quando se fala de interpretação, na hipótese da interpretação da lei, deve responder-se à questão de saber qual o conteúdo que se há de dar à norma individual de uma sentença judicial ou de uma resolução administrativa, norma essa a deduzir da norma geral da lei na sua aplicação a um caso concreto”.
A interpretação em si consiste em compreender o que está sendo lido. É a apreensão das informações contidas no texto, seja ele verbal ou não-verbal. O intérprete se comunica com o texto por meio da linguagem. É importante lembrar que não se devem transpor os limites de significação do texto, ou seja, afirmar coisas que não existem na obra do produtor.
2. A aplicação da hermenêutica no direito
É inerente ao trabalho do jurista o ofício da interpretação. A interpretação das leis e dos casos concretos ajuda a dirimir conflitos. “A própria elaboração das regras jurídicas sempre implicou um pensamento que seleciona, articula, distingue, prevê; a imposição das regras, com o julgamento e a sanção, sempre foi um momento interpretativo”[7]. Nesse sentido, é interessante citar o pensamento de Tércio Sampaio[8]:
“A determinação do sentido das normas, o correto entendimento do significado dos seus textos e intenções, tendo em vista a decidibilidade de conflitos constitui a tarefa da dogmática hermenêutica. Trata-se de uma finalidade prática, no que se distingue de objetivos semelhantes das demais ciências humanas. Na verdade, o propósito básico do jurista não é simplesmente compreender um texto, com faz, por exemplo, o historiador ao estabelecer-lhe o sentido e o movimento no seu contexto, mas também determinar-lhe a força e o alcance, pondo o texto normativo em presença dos dados atuais de um problema. Ou seja, a intenção do jurista não é apenas conhecer, mas conhecer tendo em vista as condições de decidibilidade de conflitos com base na norma enquanto diretivo para o comportamento”.
Sob essa ótica, a hermenêutica é peça imprescindível no entendimento dos textos normativos. Através da interpretação podemos diminuir o abismo gnoseológico existente entre significante, significado e fato juridicamente relevante.
“Pode-se explicar o que aqui o que se compreende por abismo gnoseológico mediante três problemas que o compõem e que precisam ser transpostos ou ao menos tratados pela teoria do conhecimento: são as incompatibilidades recíprocas entre: a) evento real; b) ideia (ou “conceito”, “pensamento”); e c) expressão linguística (ou “simbólica”). Estas são as três unidades componentes do conhecimento humano, as quais não podem ser reduzidas uma à outra. Como são todos termos ambiguamente empregados na linguagem filosófica, necessário tentar melhor precisá-los”[9].
Corroborando com essa afirmação, temos o ponto de vista de Noel Struchiner[10], quando ele afirma que “as limitações da linguagem refletem diretamente na possibilidade de concretização dos propósitos do direito”. “Em função da textura aberta da linguagem, a indeterminação linguística é indelével”[11].
É pertinente a colocação de Nelson Saldanha[12]:
“O problema da linguagem corresponde a um processo histórico-cultural fundamental para a questão do compreender, do ‘significado’ e da interpretação. A atribuição de significados, que constitui basicamente o fenômeno hermenêutico, envolve a experiência da linguagem, com o entendimento dos signos e de uma série de contextos. Trata-se de um problema essencial quanto à própria existência da cultura: toda cultura tem seus códigos”.
A hermenêutica jurídica procura delimitar o sentido e o alcance das regras jurídicas analisando todo o espaço amostral em que pode variar o significado do texto, sem esquecer-se da ambiguidade e vagueza presentes nele.
Historicamente, os romanos dividem a lei em três elementos constituintes: o corpus (corpo) significa o texto da lei, o significante da lei, o símbolo que procura representar o que a lei é de fato; a mens pode ser traduzida como o sentido da lei; e a ratio é a finalidade da lei, a que ela se propõe, a que serve: é a teleologia da lei. É nesse último caso que entra o trabalho do hermeneuta, no que concerne à explicitação, construção e aplicação da norma jurídica diante do caso concreto.
Lembrar que, a depender da interpretação, o sentido de uma lei pode ser ampliado para além do que o texto prescreve (praeter legem). Assim, o trabalho do decididor é facilitado, pois ele pode contar com um maior quórum de significações da mesma coisa. E isso é importante porque a realidade e bastante complexa e específica, diferentemente do que a nossa mente nos transmite, uma vez que esta é generalista.
3. A relação entre interpretação, aplicação e integração no Direito
A tarefa de interpretar consiste em procurar o entendimento do texto em análise. Sobre a mesma lei, por exemplo, podemos ter várias interpretações (aqui entram os conceitos de ambiguidade e vagueza; sentido e alcance), porém só uma nos será útil e/ou favorável para a resolução da lide.
Em íntima relação com a interpretação, temos a aplicação, que consiste em aglutinar a interpretação da letra de uma lei com a realidade imposta; juntar norma e caso concreto.
Por seu turno, a integração tem por objetivo procurar preencher as lacunas existentes no ordenamento jurídico. Lacunas são conhecidas, de uma maneira simplificadora, como “regras de menos”. É falta de fontes do direito que versem sobre um ou outro caso específico. É a falta de norma adequada para ser aplicada a um fato, a uma questão.
Para resumir, devemos assinalar o que Miguel Reale[13] ensina:
Interpretação, integração e aplicação são três termos técnicos que correspondem a três conceitos distintos, que às vezes se confundem, em virtude de sua íntima correlação. O Direito [...] é sempre uma prescrição ou imperativo, e não uma simples indicação que possa ou não ser atendida, a critério exclusivo dos interessados. O Direito existe para ser obedecido, ou seja, para ser aplicado. Todos nós, na nossa vida comum, aplicamos o Direito. Não se realiza contrato algum sem que uma forma de juridicidade se aplique nas relações humanas.
O termo "aplicação do direito" reserva-se, entretanto, à forma de aplicação feita por força da competência de que se acha investido um órgão, ou autoridade. O juiz aplica o Direito porquanto age, não como homem comum, mas como membro do Poder Judiciário. O mesmo acontece com o administrador. A aplicação do Direito é a imposição de uma diretriz como decorrência de competência legal.
Mas, para aplicar o Direito, o órgão do Estado precisa, antes, interpretá-lo. A aplicação é um modo de exercício que está condicionado por uma prévia escolha, de natureza axiológica, entre várias interpretações possíveis. Antes da aplicação não pode deixar de haver interpretação, mesmo quando a norma legal é clara, pois a clareza só pode ser reconhecida graças ao ato interpretativo. Ademais, é óbvio que só aplica bem o Direito quem o interpreta bem.
Por outro lado, se reconhecemos que a lei tem lacunas, é necessário preencher tais vazios, a fim de que se possa dar sempre uma resposta jurídica, favorável ou contrária, a quem se encontre ao desamparo da lei expressa. Esse processo de preenchimento das lacunas chama-se integração do direito (...)”.
4. O silogismo jurídico
Como se pode pensar, num primeiro momento, uso de silogismos (algumas vezes, quase que usando uma lógica automática, instantânea) no fazer jurídico não tolhe a capacidade de interpretação nem limita a atuação do jurista no seu trabalho com os textos jurídicos. Ao contrário, a interpretação é algo de uma significação muito grande na prática do direito.
De um modo genérico, podemos caracteriza um silogismo como contendo três partes: premissa maior, premissa menor e conclusão. Trazendo o silogismo para os usos no direito temos que a premissa maior é a lei, aplicada em consonância com o caso concreto, que é a premissa menor. A conclusão é essa aplicação da lei para o caso concreto.
O silogismo jurídico é um tipo de silogismo prático, pois vem revestido da ideia de um dever ser (deontologia). Ele prescreve como devem agir os indivíduos aos quais se aplicam uma norma específica. Esse é diferente do silogismo teórico, que apresenta uma conclusão que afirma algo e não necessariamente regula ou prescreve uma norma de conduta.
5. Os métodos tradicionais de interpretação
“Os chamados métodos de interpretação são, na verdade, regras técnicas que visam à obtenção de um resultado. Com elas procuram-se orientações para os problemas de decidibilidade dos conflitos”[14].
5.1 Método exegético
Pregado pela Escola da Exegese francesa, esse método é levado a cabo pelos apregoadores do juspositivismo legalista. Este defende uma antropologia iluminista, em que a razão sobrepõe a vontade (emoção). Afirma que a lei é sinônimo de norma jurídica, ou seja, a linguagem humana descreve a realidade tal como ela é. Nesse caso temos a univocidade da linguagem. Isto constitui um equívoco: pensar que normas e texto são a mesma coisa[15]. Também temos que o juiz nunca origina a lei, sendo simplesmente um aplicador dela (la bouche de la loi), apenas reconhecendo o direito. Sendo assim, a interpretação é sempre literal: deve-se aplicar exatamente o que está no texto da lei, daí o brocardo in claris non fit interpretatio (na clareza, não cabe interpretação). O justo é aquilo que a lei diz que é justo. Aqui encontramos a tese da única resposta correta, encontrada dedutivamente.
Vale salientar que a autora do texto concorda com Maria Helena Diniz[16] na afirmação de que nenhuma norma é tão clara que não seja passível de interpretação. Baseado nisso, vê-se tacitamente o desprezo dela pelo legalismo.
5.2 Método lógico
Aqui não são mais analisados os termos do texto prescritivo separadamente. Interpretam-se as proposições veiculadas por ele, de uma maneira que se tenha um entendimento global.
As possíveis ambiguidades que possam advir desse tipo de interpretação são aclaradas com base na apreciação do termo ambíguo no contexto em que ele foi empregado. Comumente, esse termo ambíguo é empregado em contexto diversos, daí o surgimento de dívidas a seu respeito.
“Trata-se de um instrumento técnico, inicialmente a serviço da identificação de inconsistências. Parte-se do pressuposto de que a conexão de uma expressão normativa com as demais do contexto é importante para a obtenção do significado correto. Não obstante as exigências de compatibilidade lógica ocorrem, no entanto, inconsistências quando, às vezes, num mesmo diploma legal, usa-se o mesmo termo em normas distintas com consequências diferentes”[17].

5.3 Método sistemático
Na aplicação do método sistemático, confronta-se uma lei com outras partes da mesma lei ou do mesmo ordenamento, a fim de que sejam esclarecidas possíveis dúvidas.
“A pressuposição hermenêutica é a da unidade do sistema jurídico do ordenamento. Há aqui um paralelo entre a teoria das fontes e a teoria da interpretação. Correspondentemente à organização hierárquica das fontes, emergem recomendações sobre a subordinação e a conexão das normas do ordenamento num todo que culmina (e principia) pela primeira norma-origem do sistema, a Constituição”[18].
5.4 Método teleológico
Segundo o dicionário Aurélio, teleologia é o estudo das finalidades. Então o método teleológico se presta a procurar os fins sociais da aplicação da lei. Procurar-se a finalidade de uma lei, a que ela se refere. Temos aqui uma ideia utilitarista, em que sempre poderemos atribuir um propósito, uma consequência, uma utilidade à lei.
5.5 Método histórico-evolutivo
O método histórico-evolutivo leva em consideração as condições históricas quando da formulação de uma lei, para que daí sejam tiradas conclusões. Podemos também comparar a norma atual coma sua precedente e saber o que levou a esta ser criada e o que mudou e permaneceu da sua criação até os dias atuais.
“Foi especialmente sob a inspiração da Escola Histórica de Savigny que surgiu outro caminho, a chamada interpretação histórica. Sustentaram vários mestres que a lei é algo que representa uma realidade cultural, ou, para evitarmos a palavra cultura, que ainda não era empregada nesse sentido, - era uma realidade histórica que se situava, por conseguinte, na progressão do tempo. Uma lei nasce obedecendo a certos ditames, a determinadas aspirações da sociedade, interpretadas pelos que a elaboram, mas o seu significado não é imutável.
Feita a lei, ela não fica, com efeito, adstrita às suas fontes originárias, mas deve acompanhar as vicissitudes sociais. É indispensável estudar as fontes inspiradoras da emanação da lei para ver quais as intenções do legislador, mas também a fim de ajustá-la às situações supervenientes”[19].
6. Críticas à hermenêutica jurídica
Antes de entrarmos no mérito das críticas, vale lembrar que a maneira de designação de conceitos não é inerte: temos o produtor do texto e temos o intérprete que intenta determinar sentidos válidos a respeito do texto analisado.
Um equívoco presente nos meios hermenêuticos diz respeito à neutralidade do profissional do direito na interpretação de um texto normativo, na melhor inferência a respeito dele e consequentemente na escolha da mais justa, equânime, íntegra e apropriada decisão. Isso não existe.
Não há afastamento suficiente a fim de que seja resolvido um caso concreto de maneira totalmente neutra. O jurista traz consigo convicções inerentes a ele e que independem de com o que ele esteja lidando.
Por mais que uma pessoa tente ser imparcial ou neutro no momento da interpretação, ele jamais o será na sua totalidade, pois sofrerá influências externas do seu momento histórico, da sua cultura, de seus hábitos, etc., visto que nós, na qualidade de seres humanos, estamos sujeitos a isso.
Embora busquemos o modelo autopoiético ideal, sempre seremos permeados por uma certa dose de alopoiese.
7. A renovação da prática hermenêutica
A hermenêutica clássica com suas metodologias e técnicas inexoráveis sofreu críticas devido à crença de que essa “velha” hermenêutica não atendia aos propósitos dos teóricos.
Pregou-se, assim, uma “nova” hermenêutica, com uma maneira de interpretar mais maleável e menos rígida, mas nem por isso a prática clássica deixou de ser usada.
8. O método de interpretação pela lógica do razoável
A lógica formal, por tratar eminentemente de juízos formais não é suficiente para lidar com o direito, uma vez que este se ocupa também com valores. A realidade jurídica é complexa demais para que seja estudada por um simples encadeamento lógico. Seria a ideia de bom senso na prática da interpretação de uma lei, por exemplo, onde não cabem interpretações literais do texto, ou seja, não são admitidas conclusões “ao pé da letra”. Nesse sentido, Miguel Reale[20] coloca que:
“As doutrinas jurídicas mais atuais, como a teoria tridimensional, a da ‘concreção jurídica’, de Karl Engisch, Josef Esser, Karl Larenz e outros; o experiencialismo de Wendel Holmes ou Roscoe Pound; o neo-realismo norte-americano; a "teoria egológica" de Carlos Cossio; o rácio-vitalismo de Recaséns Siches; a teoria da argumentação de Perelman; ou a compreensão integral do Direito de Luigi Bagolini ou de Tullio Ascarelli, demonstram, à saciedade, que a aplicação do Direito não se reduz a uma questão de lógica formal. É antes uma questão complexa, na qual fatores lógicos, axiológicos e fáticos se correlacionam, segundo exigências de uma unidade dialética, desenvolvida ao nível da experiência, à luz dos fatos e de sua prova”. (grifo nosso)
Para ilustrar o supracitado, imaginemos a seguinte situação hipotética: num bar temos uma placa dizendo “proibido som de carro”. Certo dia chega um indivíduo com um micro system com bateria própria no referido bar ligando seu aparelho que faz tanto barulho quanto o som de carro, alegando que seu equipamento não se trata de um som de carro e que, por isso, pode ligá-lo. Pela lógica do racional, esse indivíduo estaria certo, mas é razoável pensar que a placa não prescreve uma proibição específica ao som de carro, e sim a qualquer modalidade de som que possa perturbar a ordem pública. Aqui é a atitude sensata que impera.
Nesse contexto, fica mais do que evidente que o legalismo se torna um caminho profundamente equivocado. O texto em si não se esgota na sua significação. Ele não é universal, embora pretenda isso. São infinitas as possibilidades a que os seres humanos estão sujeitos. É por isso que as regras de 1º grau (as contidas nos códigos dogmáticos do vade mecum) são tão numerosas e voláteis.






Referências Bibliográficas
Referência Primária
BROCHADO, Mariá. Apontamentos sobre hermenêutica jurídica. Revista Jurídica Virtual. Presidência da República (Cessou em 2005. Cont. 1808-2807 Revista Jurídica (Brasília. Online)), v. 13, p. 227-262, 2011.
Referências Secundárias
ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional – sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2008.
______. Ética e Retórica, para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva. 2002.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 20.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. de MACHADO, João Baptista. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999. p.
MACIEL, José Fábio Rodrigues. História da Hermenêutica Jurídica. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=1011>. Acesso em: 15 de abr. 2012
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1965.
PALMER, Richard. Hermenêutica. Trad. Maria Luísa Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1969.
REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2004.
SALDANHA, Nelson. Ordem e hermenêutica. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.



[1] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1965. p. 13.
[2] MAXIMILIANO, Carlos. op. cit., loc. cit.
[3] SALDANHA, Nelson. Ordem e hermenêutica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 218 – 219.
[4] PALMER, Richard. Hermenêutica. Trad. Maria Luísa Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1969, p. 23.
[5] MACIEL, José Fábio Rodrigues. História da Hermenêutica Jurídica. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=1011>. Acesso em: 15 de abr. 2012
[6] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. de MACHADO, João Baptista. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999. p. 245.
[7] SALDANHA, Nelson. Op. cit. p. 300.
[8] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. Técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 256.
[9] ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica, para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 288.
[10] STRUCHINER, Noel. Op.cit.
[11] Idem. Ibidem.
[12] SALDANHA, Nelson. Op. cit. p. 220.
[13] REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 277.
[14] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Op. cit. p. 286.
[15] ADEODATO, João Maurício. A construção retórica do ordenamento jurídico – três confusões sobre ética e direito. In: ADEODATO, João Maurício. A retórica constitucional – sobre tolerância, direitos humanos e outros fundamentos éticos do direito positivo. São Paulo: Saraiva, 2008.
[16] DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 20.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 204.
[17] FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Op. cit. p. 287.
[18] Idem. p. 288.
[19] REALE, Miguel. Op. cit. p. 264 – 265.
[20] REALE, Miguel. Op. cit. p. 283.

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